Publico o texto abaixo escrito no jornal "O Estado de São Paulo" pelo jornalista João Melão Neto. É curioso notar o que ele observou sobre o conservadorismo. O conservador não é contra as novidades e o progresso. Ele é a favor da evolução segura com aproveitamento das experiências e conhecimentos de toda uma existência. Um progresso seguro. Ele deduz que o melhor regime é a democracia e nos faz pensar que os conservadores são democratas e que seus posicionamentos são considerados em todos os países. Aonde estão os conservadores do Brasil? Boa leitura:
“Embora conservadorismo,
na cabeça das pessoas, lembre mofo e bolor, a verdade é que o conservadorismo
está voltando a ser levado a sério por aqui. E quais são as principais teses
defendidas pelos conservadores?
A
principal delas afirma que é muita pretensão a nossa de querer virar o mundo do
avesso, ignorando toda a experiência, os ajustes e o processo de tentativas e
erros obtidos em milênios de civilização. Tal abandono do passado pode ser útil
no que tange às ciências exatas, mas revela-se quase sempre desastroso quando
aplicado às ciências humanas. Na História humana, os grandes avanços
sempre se deram pela evolução, nunca pela revolução. As grandes
revoluções, como a francesa ou a russa, sempre foram muito eficientes na
derrubada das instituições que já existiam, mas nunca souberam como pôr outras
melhores em seu lugar.
Outra tese, dentre as
principais, se resume numa frase proclamada por sir Isaac Newton (1643-1727):
àqueles que lhe indagavam como conseguira formular a Teoria da Física Mecânica,
respondia que nada fizera de mais, apenas "se debruçara sobre os ombros de
gigantes". Queria o cientista inglês dizer que nada daquilo seria possível
se não tivesse contado com o conhecimento acumulado por todos os que o precederam.
Os conservadores também pensam dessa forma. A realidade tal qual a conhecemos é
o produto de milênios de tentativas, erros e acertos. Sendo assim, é
muito pouco provável que nós, modernos, venhamos a fazer alguma grande
descoberta em termos de moral ou de política.
Filósofos de araque
existem em profusão.
Todos pregam mudanças radicais na natureza humana. E foram
justamente eles - que prometiam a perfeição do homem e da sociedade - que
transformaram grande parte do século passado num verdadeiro inferno terrestre.
O ceticismo quanto à perfeição
humana é outro aspecto importante do pensamento conservador. Nós conseguimos
realizar mudanças na natureza exterior. Já a natureza humana se tem mostrado
praticamente imutável. O conservador não acredita que exista algum homem tão
acima da média, tão isento de paixões e preconceitos que se possa com
tranquilidade entregar-lhe um poder sem limites. Assim sendo, a melhor forma de
governo é mesmo a democracia. Esta dispõe dos freios e contrapesos
(checks and balances) necessários para refrear logo no nascedouro qualquer
tentação totalitária. A sociedade possui anticorpos. E eles são acionados
sempre que há exorbitância de poder.
O grande autor moderno do
conservadorismo é Russell Kirk (1918-1994) e no passado foi Edmond Burke
(1729-1797). Este último, além de ter sido o grande precursor dos princípios
conservadores, notabilizou-se por ter escrito um livro intitulado Reflexões
sobre a Revolução em França, no qual, ainda no calor dos acontecimentos,
defende ardorosamente o sistema político inglês - de reformas graduais, em
contraposição ao extremismo e às exorbitâncias que ocorriam do outro lado do
Canal da Mancha. Depois que Luiz XVI foi guilhotinado, em 1792, Burke voltaria
ao tema, argumentando que os franceses teriam cometido um erro político
gravíssimo: "Vocês ainda haverão de se arrepender amargamente deste ato.
Ao invés de fazer como a Inglaterra, que em 1688 promoveu todas as reformas
necessárias pacificamente e ainda com a chancela real, vocês, franceses, acabam
de proclamar oficialmente a sua orfandade. E viverão eternamente carentes de um
rei". Os fatos demonstraram que Burke tinha razão. Depois de Luiz XVI, os
franceses viriam a proclamar diversos reis e imperadores, sendo o mais
importante deles Napoleão Bonaparte.
Nos dias de hoje, quem
passa por cima do viaduto d'Alma, em Paris, encontra uma espécie de santuário
onde muitos acendem velas e pedem milagres. Nesse mesmo local, uns 20 metros abaixo, num
acidente de automóvel, morreu Lady Di. Diana Frances Spencer não era uma santa
(longe disso), mas foi uma princesa. Seria mais um indício de que Burke tinha
razão?
Voltando às principais
teses conservadoras, um conservador de verdade não tolera o relativismo moral.
Ainda no século passado, terríveis consequências sofreram os povos onde ocorreu
um colapso da ordem moral, onde os cidadãos transigiram quanto a isso. A
moral há de ser uma só, seja ela fruto de revelação divina ou tenha sido
forjada pela convenção humana. Ela é o resultado de um arranjo costumeiro,
cuja origem data de tempos imemoriais. E é ela que nos preserva do abismo.
O pensamento conservador,
nos dias atuais, vem ganhando relevo justamente porque os recursos naturais
estão se tornando exíguos. Três décadas atrás ninguém demonstrava a menor
preocupação com esse tema. Agora ele ocupa o proscênio das preocupações
humanas. O polêmico aquecimento global e o esgotamento de matérias-primas
importantes põem na ordem do dia a necessidade premente de preservar. E
preservar é a principal bandeira do pensamento conservador - que não cuida
somente de instituições sociais, mas abrange tudo o que diz respeito à
humanidade.
Quem imaginava ser a
ecologia uma bandeira de esquerda percebe agora que não é. Foi o comunismo, aliás, o regime
político que mais sacrificou a natureza. Tudo em nome do progresso, conceito que vem sendo cada vez mais
questionado pela opinião pública esclarecida. Os adeptos mais exaltados do
pensamento conservador não acreditam na existência de progresso algum. Eles
defendem, sim, mudanças graduais.
Os principais países
desenvolvidos têm, todos eles, partidos conservadores que disputam e vencem
eleições. Por que será que só aqui, no Brasil, os conservadores relutam em se
admitir como tal?
Se o problema é a falta
de alguém que puxe o cordão, tudo bem. Eu me declaro um conservador. E não
tenho por que ter vergonha disso.”
16 de novembro de 2012
O Estado de S.Paulo
JOÃO MELLÃO NETO
JORNALISTA;
FOI DEPUTADO, SECRETÁRIO E MINISTRO DE ESTADO;
E-MAIL: J.MELLAO@UOL.COM.BR;
FAX: 11 38451794;
FACEBOOK: JOÃO MELLÃO NETO
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