O texto seguinte
apresenta uma análise do Professor Sérgio Paulo Muniz Costa, publicada no dia
sete de novembro próximo passado. Esta análise trás um alerta da História para
fatos recentes ocorridos no País, quando o PT questionou a atuação do Supremo
Tribunal Federal no caso do “Mensalão” e às condenações aplicadas. Os grifos
foram feitos por mim e o texto do professor foi “postado” em um grupo de
discussão “BOP – Ordem e Progresso” do Facebook. Segue o texto:
"A História, fonte de
conhecimento para tantas ciências sociais, é um caminho para a compreensão dos
acontecimentos. Hoje, dispomos de muitas referências históricas para o
entendimento das estruturas políticas contemporâneas, mas o megaestudo de caso
das patologias sociais que ainda inquieta corações e mentes do século 21 é o
que ocorreu na Alemanha há oitenta anos, o mais documentado episódio da era dos
equívocos. Uma combinação trágica de voluntarismo com populismo.
O historiador Joachim
Fest conta a resposta do indivíduo central dessa tragédia quando pediram a ele
que considerasse a paz com a União Soviética, no outono de 1943: "Sabe,
Ribbentrop, se eu entrar em acordo com a Rússia hoje, acabo declarando guerra
novamente amanhã – esse é meu jeito". No caso, o "jeito" de
Hitler significou a maior destruição da Europa do Leste desde a invasão mongol
do século 13.
Um outro biógrafo de
Hitler, Ian Kershaw, mostra como "planejadores, organizadores, teóricos da
dominação e os tecnocratas do poder na liderança das SS viram a Polônia como um
playground experimental" e, junto com políticos, servidores públicos
"inventivos", oficiais e soldados, foram mortalmente eficazes na
convicção de estarem "trabalhando para o Führer" – o que se explica
naquilo que Renzo de Felice identificou como o "mito do chefe",
essencial para um "regime político de massa".
Povos se agitam e entram em conflito pelo que
lhes parece justo. Como as pessoas, acertam e erram – mas como coletividades,
seus acertos e erros são incomensuravelmente mais extensos e profundos à luz da
História. Hoje, após muitos desastres, nossa civilização vive a pretensão de
evitar o mal antes que se consume.
A devastação moral da
Alemanha nazista ensina que não há equívoco atribuível a um só indivíduo, nem
coletividades inocentes perante os infortúnios que ocorrem. O caso alemão foi
um exemplo extremo de como energia, capacidade e determinação de um povo podem
causar tanto mal.
Mais importante é a lição
daí extraída: não há povos melhores do que outros a ponto de não correrem risco
de errar. Com suas crenças, rivalidades e vulnerabilidades, todos estão
sujeitos ao erro e a única coisa que parece diminuir sua extensão é o medo de
cometê-lo.
Essa instituição, a primeira de
todas, tem nome: Constituição.
O que a História ensinou
nesta parte do mundo é que o governo não faz a Constituição: cumpre-a. Isto
também tem nome: democracia. Portanto, quando o mito do chefe supera as instituições,
a democracia está em risco.
É o que está acontecendo
no Brasil. O partido político que governa o País há quase uma década se recusa
a acatar o julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a prática política que
o envolve no maior escândalo de corrupção de nossa história. Essa afronta às
instituições, à Constituição e à democracia é justificada no discurso petista
pelas "mudanças" que Lula teria promovido no País. O que a militância
petista não percebe é que esse discurso coloca seu líder em estranha posição
(que ele negou muitas vezes), semelhante à de um certo cabo Adolfo que mudou a
Alemanha à custa de suas instituições, Constituição e democracia.
Em relação ao julgamento
dos golpistas de Munique em 1924, como asseverou John Toland, "o sentido
político das acusações [...] contra Hitler, Ludendorff e mais oito acusados
ultrapassava de muito o destino pessoal de cada um dos réus. A nova república e
a democracia também estavam em julgamento".
Acossada por todos os
lados, a República de Weimar deveu sua sobrevida também à condenação de alguns
dos responsáveis pelo Putsch, o principal deles Hitler, que, no entanto, sairia
da prisão antes do prazo de detenção, ovacionado como herói graças à propaganda
e à intimidação à Suprema Corte da Baviera.
Está fora de questão que esta
República no Brasil se deixe intimidar, uma tentativa que deve causar a mais
viva indignação à sociedade e, muito particularmente, aos militantes do PT.
Afinal, o precedente
histórico também tem nome: fascismo.
Sérgio Paulo Muniz Costa
é historiador
Publicado no Diário do Comércio
em 07/11/2012"
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