O texto abaixo, do Filósofo Denis Lerrer, foi
publicado no jornal "O Estado de São Paulo". O articulista descreve o
processo pelo qual a corrupção toma conta do País. Esse processo se enquadra
nas estratégias subversivas que descrevemos. A corrupção e o descrédito das
instituições são partes do plano de poder em andamento, cujo objetivo é a
instauração do totalitarismo comunista no Brasil. Boa Leitura.
"A corrupção desvendada no escritório da
Presidência da República em
São Paulo , no marco da Operação Porto Seguro, comandada pela
Polícia Federal, mostra em ação uma forma de corrupção com marcas distintivas,
que não podem ser simplesmente equiparadas à corrupção dita patrimonialista do
Estado brasileiro. O mesmo vale para justificativas de que o PT, no dizer de
dirigentes, caiu no erro de fazer o que todos os partidos fazem, como ocorreu
no mensalão.
As tentativas de nivelar essas formas de corrupção,
tudo reduzindo a um mesmo sistema, terminam por encobrir o que as diferencia,
produzindo uma espécie de geleia geral. E essa geleia geral é extremamente
perniciosa, pois a sua resultante é uma desresponsabilização dos atores
envolvidos, indivíduos ou organização partidária.
No
caso da Operação Porto Seguro, salta à vista o nível dos envolvidos: 1) a chefe
do escritório da Presidência, Rosemary Nóvoa de Noronha, que se apresentava
como "namorada" do ex-presidente Lula; 2) os irmãos Paulo e Rubens
Vieira, diretores, um da Agência Nacional de Águas (ANA), o outro da Agência
Nacional da Aviação Civil (Anac); 3) José Weber Holanda, advogado-geral adjunto
da União. Note-se que não se trata de personagens secundários, denominação que
procura desqualificá-los, como se o PT não estivesse envolvido nessas
indicações. A desqualificação tem o objetivo de produzir uma espécie de
desresponsabilização partidária, como se o partido nada tivesse que ver com
membros seus no alto escalão.
Pior ainda, Lula tem alguém de sua intimidade
amplamente envolvida em crimes. É bem verdade que a vida privada do
ex-presidente lhe diz exclusivamente respeito, o que não significa que suas
repercussões em tráfico de influência, pareceres forjados e falsidade
ideológica não devam ser consideradas em suas consequências propriamente
públicas. A vida privada do ex-presidente Lula tornou-se pública pelos ilícitos
e crimes cometidos por sua "namorada" e companheiros.
O caso dos irmãos Vieira é também emblemático, pois
se trata de diretores de agências reguladoras, que deveriam zelar pelo
cumprimento dos contratos e pelo interesse dos cidadãos em geral, em atividade
técnica de cunho suprapartidário. Ora, com a chegada de Lula ao governo
federal, essas agências foram literalmente aparelhadas partidariamente,
perdendo progressivamente a sua função. O que estamos observando é o resultado
desse processo de apropriação partidária do Estado, ganhando a corrupção um
matiz propriamente ideológico.
José Weber Holanda tampouco é um personagem
qualquer, atuando como vice-ministro e falando em nome do titular. Trata-se, é
evidente, de um cargo da maior importância na estrutura estatal.
Logo, não podem ser todos esses personagens
considerados como "secundários" ou "mequetrefes", pois tal
consideração seria um abuso para com os cidadãos deste país, incapazes de
discriminar quem é quem. Na verdade, um desrespeito à coisa pública, à res
pública, e à cidadania em geral.
A questão central é: como chegamos a isso?
Todos os personagens em causa têm uma história
comum de militância petista, tendo ascendido na hierarquia estatal graças à sua
adesão partidária. Seu "mérito", por assim dizer, é partidário, o que
significa dizer que o PT não se pode eximir dessa também sua responsabilidade.
Se não houvesse tal volúpia de aparelhamento do Estado, provavelmente não
estaríamos observando esses malfeitos.
Convém alertar para outro fato, cuja conotação
ideológica é ainda mais nítida. O PT, em sua formação e mesmo em seus
prolongamentos em certas instâncias e setores partidários atuais, caracterizou-se
por uma postura anticapitalista, considerando, no dizer de Rousseau e Marx, a
propriedade privada e o lucro como uma espécie de roubo. Da mesma maneira, o
mercado sempre foi visto com desconfiança, concebido desordenado e carente de
regras. Em suas versões mais radicais, alimentadas por certos
"intelectuais" petistas, mercado seria equivalente a "mercado
negro".
Se o mercado é a mesma coisa que "mercado
negro", é porque, para eles, não seria constituído por um conjunto de
regras. Não lhes ocorre que o mercado se define por relações contratuais, pela
confiança, pelo respeito a esses mesmos contratos, pela liberdade de escolha,
pela livre-iniciativa e pela liberdade em que esta está ancorada. Define-se,
também, pela existência de tribunais que julguem infrações contratuais, pela
elaboração de um sistema de leis que garanta a segurança jurídica, pela
participação dos eleitores na escolha dos seus dirigentes, pela competição
comercial e partidária, e assim por diante. Então, se o mercado é tido por
"mercado negro", as portas estão abertas para a corrupção ideológica,
numa espécie de vale-tudo.
Nesse sentido, a corrupção para proveito pessoal,
como é o caso do grupo de Rosemary, não deixa de ter uma conotação ideológica,
mesmo em seus aspectos mais íntimos e prosaicos. Isso se torna ainda mais claro
na corrupção partidária. Ambas estão enraizadas numa mentalidade de cunho
anticapitalista. Segundo essa concepção, o mercado nada mais é que uma forma de
enriquecimento ilícito e, na verdade, selvagem. Portanto, tudo seria permitido
numa sociedade capitalista, aí incluindo a corrupção e, em particular, a
corrupção política e ideológica. Os corruptos seriam "iguais" aos
outros.
Quero dizer com isso que essa forma de corrupção
atual se funda numa concepção antimercado, conforme a qual tudo seria
permitido. As causas dessa corrupção não estão no "sistema", como
continua sendo apregoado, mas numa mentalidade antimercado, antidireito de
propriedade e anti-Estado de Direito, que tudo nivela ideologicamente. E é esse
nivelamento ideológico que abre espaço para essa associação entre corrupção e
política."
DENIS LERRER ROSENFIELD
17 de dezembro de 2012
Professor de Filosofia na UFRGS
e-mail: denisrosenfield@terra.com.br
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